Finalmente recebi críticas pelo que escrevo aqui. Já estava ficando preocupado. Falo mal da esquerda ao defender o aumento da repressão ao crime, escrevo textos intimistas ao estilo blog de guria, critico o PAC com um viés conservador e mantenho total silêncio em relação ao governo Yeda, e ninguém falava nada. A audiência dessa página é tão baixa que eu já estava pensando em tratar da vitória do Alemão no Big Brother, do aquecimento global ou do milésimo gol do Romário. Um surto de comentários (dois, mais precisamente), no entanto, me mantiveram na linha, e indutivamente colaboraram com minha tese precursora acerca do tédio juvenil em que vivemos.
Aliás, li nesse último fim de semana, enquanto esperava o coelhinho, Até o dia em que o cão morreu, de Daniel Galera. A história que me levou ao livro é meio longa, ao contrário da do livro, que é curtíssima – contada em cerca de 95 páginas, podendo ser lida numa cagada, como diz meu amigo Vinícius Cardia. Mas a primeira também é interessante: Fiquei sabendo do livro através de uma reportagem da Carta Capital, e imediatamente recorri aos meus amigos mais letrados em busca da obra. Muitos conheciam o autor, mas o livro, não teve jeito, tive que comprar. O que despertou tamanho interesse em mim foi o fato de poucas vezes ter me identificado tanto com um personagem como agora: o protagonista da história é um jovem de cerca de 25 anos, formado em Letras, sem emprego fixo, que mora sozinho num apartamento no Centro de Porto Alegre, contando com o auxílio financeiro dos pais, e que gasta seu tempo melancolicamente olhando pela janela, caminhando pelas redondezas e tomando cerveja. Ajustando um detalhezinho ou outro, é de mim que o livro trata. Até as características de suas visitas à casa paterna e da pilha de livros num canto do quarto são iguais. Pus na cabeça que precisava saber o final dessa história, comprei o livro e o devorei.
Esse trabalho de Galera trata exatamente do tédio. Não daqueles que nos acometem nas tardes de domingo, de inverno e chuvosas. Trata-se da descrição micro de um sentimento mais amplo, que atinge os jovens dos dias de hoje. Isso já foi tratado aqui, inclusive nos tais textos intimistas. Com Galera, virou livro, que do ponto de vista literário não apresentou, pelo menos a mim, grande valor – é daqueles que avacalham o português achando que estão inovando na linguagem, ao escrever diálogos sem travessões ou aspas, ou ao escrever “tou” no lugar de “estou”, por exemplo – mas me ganhou no enredo. É a nossa falta de tesão, de rumos, de fé que é discutida, sem caricaturas e com sutileza.
A obra tem trechos interessantes que descrevem esse tédio contemporâneo. Num deles, o personagem apresenta a realidade em que está, ao afirmar que poderia tocar seus projetos, procurar um emprego mais estável, que teria condições para isso, se não fosse sua completa falta de vontade. Ou seja, a mediocridade o satisfazia, pois lhe faltava uma fonte de energia que o impulsionasse, e lhe sobravam dúvidas em relação à utilidade de seus esforços. Noutro, repara que as notícias do jornal tendem a se repetir a cada três dias, com pontos mais ou menos assim: dólar sobe ou desce, mais um acidente grave no trânsito, uma pessoa foi assassinada, médicos suspeitam que tal coisa pode ser a cura para tal doença, e por aí vai.
O atrito nesse ambiente se dá entre outros dois personagens, que deixam o principal como espectador da realidade, em oportunidades que pouco temos na vida real de forma perceptível. Esses personagens são o cão - de rua, encontrado na volta de um bar durante a madrugada, na Praça da Alfândega, um vira-latas, enfim - e Marcela, uma modelo que conheceu estando bêbado, os dois, e a partir de quando passaram a ter relações sexuais casualmente. O cão e Marcela representam dois extremos: o tédio como característica intrínseca do indivíduo atual, e o sentimento não menos intrínseco de luta contra essa situação. O livro, porém, e quem o leu sabe, é otimista em relação ao que vivemos hoje, não necessariamente sobre o futuro, mas na sua sugestão de atitude.
Daniel Galera tem 28 anos, é paulista, mas mora em Porto Alegre desde guri. Amanhã (quinta-feira), estará autografando Até o dia em que o cão morreu na Palavraria (Av. Vasco da Gama, 165, bairro Bom Fim), a partir das 19h (o livro virará filme, sob o título Cão sem Dono, que estreará em maio nos cinemas). Eu estarei lá. É uma boa oportunidade para alguém me assassinar, pois estou dizendo onde e quando estarei. Aí a imprensa voltaria a tratar dos crimes planejados pela internet, e essa coisa toda que se repete a cada três dias. Pelo menos aumentaria a audiência do blog. Mas enfim, será uma forma de acabar com o tédio juvenil que tenho, pois, como dizem os marxistas, somos todos construções históricas. Convido aos meus amigos para, pelo menos, tomarmos um café amanhã nessa livraria, até a hora da minha estimulante aula de Economia Brasileira Contemporânea II, com sua inflação inercial e diferentes planos heterodoxos de estabilização.
Aliás, li nesse último fim de semana, enquanto esperava o coelhinho, Até o dia em que o cão morreu, de Daniel Galera. A história que me levou ao livro é meio longa, ao contrário da do livro, que é curtíssima – contada em cerca de 95 páginas, podendo ser lida numa cagada, como diz meu amigo Vinícius Cardia. Mas a primeira também é interessante: Fiquei sabendo do livro através de uma reportagem da Carta Capital, e imediatamente recorri aos meus amigos mais letrados em busca da obra. Muitos conheciam o autor, mas o livro, não teve jeito, tive que comprar. O que despertou tamanho interesse em mim foi o fato de poucas vezes ter me identificado tanto com um personagem como agora: o protagonista da história é um jovem de cerca de 25 anos, formado em Letras, sem emprego fixo, que mora sozinho num apartamento no Centro de Porto Alegre, contando com o auxílio financeiro dos pais, e que gasta seu tempo melancolicamente olhando pela janela, caminhando pelas redondezas e tomando cerveja. Ajustando um detalhezinho ou outro, é de mim que o livro trata. Até as características de suas visitas à casa paterna e da pilha de livros num canto do quarto são iguais. Pus na cabeça que precisava saber o final dessa história, comprei o livro e o devorei.
Esse trabalho de Galera trata exatamente do tédio. Não daqueles que nos acometem nas tardes de domingo, de inverno e chuvosas. Trata-se da descrição micro de um sentimento mais amplo, que atinge os jovens dos dias de hoje. Isso já foi tratado aqui, inclusive nos tais textos intimistas. Com Galera, virou livro, que do ponto de vista literário não apresentou, pelo menos a mim, grande valor – é daqueles que avacalham o português achando que estão inovando na linguagem, ao escrever diálogos sem travessões ou aspas, ou ao escrever “tou” no lugar de “estou”, por exemplo – mas me ganhou no enredo. É a nossa falta de tesão, de rumos, de fé que é discutida, sem caricaturas e com sutileza.
A obra tem trechos interessantes que descrevem esse tédio contemporâneo. Num deles, o personagem apresenta a realidade em que está, ao afirmar que poderia tocar seus projetos, procurar um emprego mais estável, que teria condições para isso, se não fosse sua completa falta de vontade. Ou seja, a mediocridade o satisfazia, pois lhe faltava uma fonte de energia que o impulsionasse, e lhe sobravam dúvidas em relação à utilidade de seus esforços. Noutro, repara que as notícias do jornal tendem a se repetir a cada três dias, com pontos mais ou menos assim: dólar sobe ou desce, mais um acidente grave no trânsito, uma pessoa foi assassinada, médicos suspeitam que tal coisa pode ser a cura para tal doença, e por aí vai.
O atrito nesse ambiente se dá entre outros dois personagens, que deixam o principal como espectador da realidade, em oportunidades que pouco temos na vida real de forma perceptível. Esses personagens são o cão - de rua, encontrado na volta de um bar durante a madrugada, na Praça da Alfândega, um vira-latas, enfim - e Marcela, uma modelo que conheceu estando bêbado, os dois, e a partir de quando passaram a ter relações sexuais casualmente. O cão e Marcela representam dois extremos: o tédio como característica intrínseca do indivíduo atual, e o sentimento não menos intrínseco de luta contra essa situação. O livro, porém, e quem o leu sabe, é otimista em relação ao que vivemos hoje, não necessariamente sobre o futuro, mas na sua sugestão de atitude.
Daniel Galera tem 28 anos, é paulista, mas mora em Porto Alegre desde guri. Amanhã (quinta-feira), estará autografando Até o dia em que o cão morreu na Palavraria (Av. Vasco da Gama, 165, bairro Bom Fim), a partir das 19h (o livro virará filme, sob o título Cão sem Dono, que estreará em maio nos cinemas). Eu estarei lá. É uma boa oportunidade para alguém me assassinar, pois estou dizendo onde e quando estarei. Aí a imprensa voltaria a tratar dos crimes planejados pela internet, e essa coisa toda que se repete a cada três dias. Pelo menos aumentaria a audiência do blog. Mas enfim, será uma forma de acabar com o tédio juvenil que tenho, pois, como dizem os marxistas, somos todos construções históricas. Convido aos meus amigos para, pelo menos, tomarmos um café amanhã nessa livraria, até a hora da minha estimulante aula de Economia Brasileira Contemporânea II, com sua inflação inercial e diferentes planos heterodoxos de estabilização.