sexta-feira, agosto 18, 2006

Pequeno Tratado sobre a Felicidade

Poucos assuntos interessam tanto aos economistas quanto a felicidade. Afinal, a felicidade é o fim de toda ação humana, e a ação humana é o objeto de estudo dos economistas. Claro, é um tema que transcende o campo da Ciência Econômica, mas que nela também se encontra. O conceituado economista brasileiro Eduardo Giannetti da Fonseca, por exemplo, já publicou um livro chamado Felicidade, tratando do assunto.

E quando a Economia trata da felicidade, como é de se esperar, o tema acaba se moldando à linguagem dessa área, assim como ocorre quando é tratado pela Psicologia ou a Sociologia. Embora não nos seja mais uma unanimidade, a felicidade em Economia é tratada pelo que conhecemos como Utilitarismo, desenvolvido pelo filósofo Jeremy Bentham (1748-1832). Não se trata, stricto sensus, do tratamento da felicidade como tema principal, mas procura mostrar como os indivíduos agem em busca de coisas que lhes dêem mais satisfação. O Utilitarismo trouxe alguns insights importantes acerca do comportamento humano, como a idéia de plena consciência que os indivíduos têm do que preferem, a transitividade dessas preferências, e o princípio da insaciedade, ou seja, que os indivíduos sempre preferem mais a menos. Outro ponto importante nos trazido pelo Utilitarismo é a impossibilidade de agregarmos preferências, ou seja, que o que traz satisfação a um indivíduo pode ser completamente desagradável a outro. Este último princípio foi um dos argumentos mais fortes contra os modelos coletivistas de sociedade que pregam a igualdade entre pessoas com desejos e fontes de satisfação desiguais, como o ocorrido em diversas experiências comunistas ao longo do século passado. A idéia é simples: eu não gosto de rúcula, mas há quem goste. Se toda a alimentação da população fosse igual, e contivesse rúcula, minha satisfação certamente seria menor que a que eu obteria caso pudesse escolher livremente o que comer. Eu seria, com a rúcula, menos feliz.

Parei, então, esses dias, para pensar sobre o tema felicidade, mas por uma perspectiva mais ampla. E uma coisa que sempre me incomodou sobre isso foi a idéia de felicidade como algo estático na vida. Explicando: existe hoje, na mente das pessoas, a idéia de felicidade como um fim a ser alcançado na vida, uma idéia midiática de felicidade, existente só em alguns comerciais de televisão. A felicidade é vista como um ponto de ótima satisfação, acima do qual não há mais nada a ser alcançado.

Pois penso ser isso a causa de muitos males sociais. Acredito, sinceramente, que não existe felicidade para sempre – por mais chocante que isso possa parecer aos ouvidos de alguns. Se serve de consolo, tampouco acredito em tristeza para sempre. E digo isso com embasamento biológico, porque a ciência sabe que felicidade e tristeza não constituem estados permanentes de sentimento humano, mas passageiros, que se alternam no dia-a-dia conforme os momentos que vivemos. Parece óbvio, eu sei. Mas há, creio, uma busca incessante e irracional por felicidade pelos indivíduos, por um ponto de máxima satisfação que, de acordo com a minha idéia, é inalcançável. As pessoas, então, se tornam frustradas, pois tentam alcançar uma coisa que não existe. Sem saberem disso, a busca por felicidade os leva a ações extremas, o que explica muitas das perversões ou atos sem sentido que alguns indivíduos praticam, numa Juventude Desviada que independe de idades. Busca-se, por exemplo, a felicidade eterna nas drogas, no descumprimento de leis, na violência, sempre objetivando eliminar uma frustração sem causa e alcançar a um nível de felicidade que não existe.

Essa idéia de felicidade eterna é um mal do mundo moderno nos trazido pelos meios de comunicação ou em conselhos de vendedores da fórmula da satisfação. Basta fazermos uma visita a qualquer livraria para verificarmos a quantidade de livros de auto-ajuda que encontramos, contando maneiras de como ser feliz, como ter sucesso, coisas do tipo. Os anúncios comerciais são ainda mais diretos, pois deixaram de vender produtos e passaram a vender felicidade. Não compramos mais pela necessidade que temos das coisas, mas por quão felizes seremos com elas. Informações desse tipo são tantas e tão abrangentes no mundo globalizado que hoje uma criança pobre da Arábia Saudita tem total conhecimento e consciência do padrão e estilo de vida de uma contemporânea sua nos Estados Unidos. Cria-se nela, então, uma idéia de felicidade que se encontra muito além de suas capacidades, que se alcança muito longe dela. Surge, enfim, uma criança frustrada, que busca algo que não existe, sem saber.

Compara agora a Arábia Saudita à uma favela brasileira e pensa nas conseqüências dessa situação. O Brasil não é tão difícil de entender, né? É só fazer um esforcinho...

O problema é que a criança nos Estados Unidos, que, por sua vez, podemos comparar a um jovem do Bela Vista, em Porto Alegre, tampouco é feliz, pois para ele a felicidade também se encontra além, se encontra distante. Este, então, da mesma forma que o indivíduo da favela, passa a procurar a tal felicidade eterna, mas à sua maneira, em rachas de automóveis, pondo fogo em índio - como o famoso caso de Brasília - no álcool, no consumo compulsivo de uma tarde no shopping.

A forma como a sociedade contemporânea tem enfrentado a vida criou uma busca fantasiosa na mente das pessoas que pode se transformar, se já não se transformou, num perigo a nós, mesmos. O antigo lema que sempre ouvidos, que “a felicidade deve ser buscada nas pequenas coisas”, parece estar requerendo novamente seu lugar no ambiente social em que nos encontramos, sob pena de sermos destruídos em nome de uma felicidade muito além dessa (a das pequenas coisas), que é simples, mas realista. E não estou dizendo que devemos abandonar o nosso objetivo de sermos felizes, mas, como ouvi há um tempo de uma sábia senhora, “seríamos muito mais felizes se parássemos de correr tanto atrás da felicidade”.

2 comentários:

Rodrigo disse...

Certa vez recebi um e-mail que dizia algo tipo "a vida é como uma viagem, e a felicidade não é o destino, mas sim o caminho", e acho que é por aí mesmo. Quem vive "em busca da felicidade" é porque não a tem, logo, é infeliz. E desse jeito, a tendência é que continue sendo. Na verdade, a vida é uma alternância entre momentos bons e ruins: se todos os dias fossem iguais (bons ou ruins, tanto faz), seria um saco!

Anônimo disse...

Olá. Concordo com algumas coisas, mas acho que seria debilidade humana se ficássemos parados sofrendo esperando o início da felicidade. Como humanos nos agrada a idéia de alcance da felicidade. A busca do objetivo perfeito para a vida. Quando alçado, em mente um novo. Corremos Monsenhor atrás de uma cura para a nossa infelicidade. Nossa frustação isolada leva ao suicídio in facto ou in pensamento. Não preciso dizer, mas te amo. Se será para sempre não sei, mas não ficarei de braços cruzados esperando que te perca para ai lutar pela felicidade.