Era um zunido fraco, baixo, mas constante. Ficava o tempo inteiro somente na sua mente. Era um zunido psicológico, não físico. Somente ele o escutava, ninguém mais. Havia perguntado isso a outras pessoas, à sua mãe principalmente. Ela respondia que não escutava nada, mas que talvez só ela não conseguisse, pois estaria ficando surda devido à idade. Ficava a dúvida, então, se o seu zunido é que era metafísico, ou a surdez de sua mãe.
No fundo, sabia que era o zunido. A sua mãe não era a única questionada sobre isso, afinal. O zunido não mudava de volume, de tom, de forma, de nada, independentemente de onde estivesse ou do que fizesse. Era o mesmo zunido, sempre. Quando caminhava na rua, às vezes se distraía e parecia que o zunido não estava mais lá. Mas bastava perceber isso para voltar a ouvi-lo. Exatamente o mesmo zunido.
O zunido fazia as coisas lhe parecerem diferentes, mas ele não sabia bem do quê. O zunido afetava outros de seus sentidos. Além de ter dificuldade em compreender as pessoas, o zunido fazia o mundo parecer mais rápido, mais apressado. O zunido o estressava, não lhe dava sossego. Não conseguia fazer nada durante seus dias cansativos e noites insones: não podia ler, não podia ouvir música, não podia conversar, não podia ver televisão, não podia fazer nada. Suas relações com as outras pessoas eram moldadas pelo zunido que ouvia. Tudo na sua vida, aliás, parecia ser assim.
Raras vezes se queixava disso, e, quando o fazia, os outros lhe perguntavam desde quando ouvia o zunido. Ele não sabia responder. Não lembrava do momento em que isso havia começado, nem desde quando passou a perceber o zunido. Algumas vezes acreditava que sempre havia sido assim, outras vezes acreditava que não. Não lembrava se havia sido algum dia mais feliz, nem conseguia pensar se o zunido era causa ou conseqüência de algo que lhe ocorrera. Nada. Sua existência se resumia ao zunido.
Um dia, não suportando mais essa situação, num desespero que o zunido lhe impôs - como em tantas outras vezes - saiu de casa. Passou a caminhar vagarosamente pelas redondezas, sem pensar em nada fixo, simplesmente em devaneios tumultuados. Chegou ao porto vazio da cidade, passando a olhar o balançar da água, os poucos montes de terra que sobre ela estavam, o horizonte, o que pôde. Observou também alguns pássaros, a calmaria das coisas, as poucas pessoas.
E então, passou a caminhar pela costa. Primeiro devagar, depois mais rápido. E mais, e mais. E começou a correr, o mais veloz que conseguia. E mais, e mais. E o vento batia nas suas orelhas, fazendo barulho. Ele, agora, ouvia o barulho do vento, e não mais o zunido. Essa sensação lhe pareceu maravilhosa, e ele começou a correr mais e mais rápido. E ainda mais. E o barulho do vento nas suas orelhas lhe dava um prazer nunca sentido antes. E ele passou a reparar as coisas a seu redor, e viu a vida mais calma, mais normal, mais simples. E passou a entender o que as pessoas falavam. E passou a ser igual, como sempre quisera, e a ouvir como todos ouviam. E isso lhe fez correr ainda mais rápido, e mais, e mais... Até escutar, enfim, somente o silêncio.
Do vento.
No fundo, sabia que era o zunido. A sua mãe não era a única questionada sobre isso, afinal. O zunido não mudava de volume, de tom, de forma, de nada, independentemente de onde estivesse ou do que fizesse. Era o mesmo zunido, sempre. Quando caminhava na rua, às vezes se distraía e parecia que o zunido não estava mais lá. Mas bastava perceber isso para voltar a ouvi-lo. Exatamente o mesmo zunido.
O zunido fazia as coisas lhe parecerem diferentes, mas ele não sabia bem do quê. O zunido afetava outros de seus sentidos. Além de ter dificuldade em compreender as pessoas, o zunido fazia o mundo parecer mais rápido, mais apressado. O zunido o estressava, não lhe dava sossego. Não conseguia fazer nada durante seus dias cansativos e noites insones: não podia ler, não podia ouvir música, não podia conversar, não podia ver televisão, não podia fazer nada. Suas relações com as outras pessoas eram moldadas pelo zunido que ouvia. Tudo na sua vida, aliás, parecia ser assim.
Raras vezes se queixava disso, e, quando o fazia, os outros lhe perguntavam desde quando ouvia o zunido. Ele não sabia responder. Não lembrava do momento em que isso havia começado, nem desde quando passou a perceber o zunido. Algumas vezes acreditava que sempre havia sido assim, outras vezes acreditava que não. Não lembrava se havia sido algum dia mais feliz, nem conseguia pensar se o zunido era causa ou conseqüência de algo que lhe ocorrera. Nada. Sua existência se resumia ao zunido.
Um dia, não suportando mais essa situação, num desespero que o zunido lhe impôs - como em tantas outras vezes - saiu de casa. Passou a caminhar vagarosamente pelas redondezas, sem pensar em nada fixo, simplesmente em devaneios tumultuados. Chegou ao porto vazio da cidade, passando a olhar o balançar da água, os poucos montes de terra que sobre ela estavam, o horizonte, o que pôde. Observou também alguns pássaros, a calmaria das coisas, as poucas pessoas.
E então, passou a caminhar pela costa. Primeiro devagar, depois mais rápido. E mais, e mais. E começou a correr, o mais veloz que conseguia. E mais, e mais. E o vento batia nas suas orelhas, fazendo barulho. Ele, agora, ouvia o barulho do vento, e não mais o zunido. Essa sensação lhe pareceu maravilhosa, e ele começou a correr mais e mais rápido. E ainda mais. E o barulho do vento nas suas orelhas lhe dava um prazer nunca sentido antes. E ele passou a reparar as coisas a seu redor, e viu a vida mais calma, mais normal, mais simples. E passou a entender o que as pessoas falavam. E passou a ser igual, como sempre quisera, e a ouvir como todos ouviam. E isso lhe fez correr ainda mais rápido, e mais, e mais... Até escutar, enfim, somente o silêncio.
Do vento.
Um comentário:
Esse texto é, literalmente, "viajante"... Mas muito bom!
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