sexta-feira, agosto 24, 2007

Onde está todo mundo?

Sigo lendo a lendária obra de Kerouac, On the Road, com a não menos lendária tradução do Eduardo Bueno, antes que ela vire filme. Recém terminei a primeira parte, aquela em que Sal retorna à Nova York fatigado, à casa de sua tia, após esmolar por uma passagem de ônibus na Times Square. Vinha de uma, digamos, decepcionante estada em Los Angeles, depois de cruzar o país aos poucos, devagar, como quem despe uma mulher.

Tenho um problema grave: costumo me entregar à arte que aprecio. Serve para todas elas, de filmes a livros, se não músicas. Se leio Marx, por exemplo, viro marxista por duas semanas, até começar a esquecê-lo, e substituí-lo por outra coisa. Com On the Road se passa o mesmo: ando me sentindo preso em casa, com vontade de cortar o país com dez reais na carteira e uma mochila nas costas, nada mais, tomando cervejas e conversando com cada garota que encontro pelo caminho.

Na história de Kerouac, logo que Sal retorna à sua cidade, olha para os lados angustiadamente procurando seus amigos, como se eles necessariamente estivessem à sua volta, ali. Pergunta-se onde está todo mundo, mas não encontra ninguém. Ninguém está ali com ele, mesmo cercado pela multidão que já se impõe nas metrópoles dos anos 50.

Na cadeira de História Econômica Contemporânea, vi que, quando estourou a Grande Depressão dos anos 1930, a frota de automóveis dos EUA era maior que a do Brasil de hoje. Somos, então, a América de meio século atrás, a América de Kerouac: sedenta por pôr o pé na estrada, por conhecer a si própria.

Mas, enquanto isso, estamos sós. Cercados por pessoas, mas solitários em nossos objetivos, em nossos planos, na nossa ausência de ideais. Onde estarão os mochileiros que descobrem o mundo com suas irresponsabilidades, com seus poucos centavos no bolso e sua simples vontade de descobrir a vida?

Parece que cruzamos o país enfrentando a fome, o trabalho nas plantações de algodão, a chuva e o deserto. Chegamos em casa, mas não encontramos ninguém.

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