As filhas do consumismo estão morrendo de fome. Nessa vez foi uma menina de 14 anos do Rio de Janeiro. No Brasil, é o sexto caso em cerca de dois meses. Gurias que, na ânsia de se tornarem modelos e viverem das passarelas e da moda, se sacrificam ao extremo e morrem. De fome.
Esse último caso foi pouco abordado na TV. A menina, negra e pobre, morreu por falta de diagnóstico da doença – media 1,70 metro de altura, pesada 38 quilos e três hospitais públicos disseram se tratar apenas de uma anemia. Isso pode ser, sim, uma das razões do silêncio da mídia, mas, pelo menos dessa vez, provavelmente não é a principal. Sendo este o sexto caso em tão pouco tempo, é natural que haja uma certa acomodação nossa em relação ao tema. Ainda bem, pois eu tampouco agüentaria muito debate acerca disso.
Nos poucos que houve, no entanto, o formato era mais ou menos o seguinte: um médico explicando a “modernidade” da doença e as formas de diagnóstico precoce, e um representante do “mundo da moda” argumentando a inocência de seu negócio e as exceções de que se tratavam aquelas meninas. A questão clínica do problema chamou minha atenção pela sua bizarrice; a da responsabilidade, pela reflexão. Devo concordar com os tais representantes do “mundo da moda”: eles não têm nada a ver com isso.
O “mundo da moda” nada mais é do que a caricatura de um paradigma social. O que tem matado as meninas não é o seu desejo de se tornarem modelos, mas toda uma concepção de valores e ideologias que pairam hoje na sociedade de consumo. Atualmente, as culturas de massa – através de todos os seus meios, como TV, rádio, música, cinema etc – nos impõem um padrão de felicidade que por nós é absorvido como uma essência humana. E esse padrão de felicidade inclui um estereotipo de beleza física que passa a ser perseguido a qualquer custo como um valor social. As meninas estão morrendo, logo, não devido a um esforço inaudito em busca de sucesso profissional, mas porque querem se adaptar a esse padrão de beleza que recebem todo dia pelas culturas de massa.
Essa idéia fica mais clara quando lhes perguntamos quais são seus exemplos de mulheres a serem admiradas e imitadas. Todas as respostas se referirão a modelos de moda, cantoras pop, enfim, as chamadas “artistas” ou celebridades. As crianças consomem beleza e moda desde pequenas: a Barbie é loira, de olhos azuis, e rica; o que se vende hoje às crianças não são brinquedos, mas o “vestidinho da Xuxa”, a “sandalinha da Eliana” e a “bolsinha da Angélica”; a Carla Perez é apresentadora de programa infantil. Essas formam o padrão de personalidade a ser imitado. Ou seja, os valores sociais – aquilo que se considera bom, bonito, honroso, digno de reconhecimento – estão completamente distorcidos. A distorção, todavia, não é na atitude de morrer por um objetivo, mas em que objetivo é esse. Madame Curie, por exemplo, uma cientista polaca vencedora de dois Prêmios Nobel, também morreu devido ao exercício exaustivo de sua profissão, de câncer. Essa, no entanto, não é apontada como um modelo de mulher a ser seguido.
Nunca vi ninguém se matar de tanto ler Kant ou, trazendo para uma dimensão mais terrena, de tanto estudar para uma prova ou para um concurso. Se matar para ficar bonita, no entanto, já temos meia dúzia de casos em dois meses. Isso simboliza a diferença de importância que as pessoas dão às coisas: hoje, ser bonito é mais importante que adquirir cultura, que adquirir capacidade de reflexão, que adquirir conhecimento. Ser bonito é mais importante que viver. Em nada nos adianta viver se não somos bonitos, se a nossa beleza não está enquadrada aos moldes determinados pela sociedade de consumo, pois nossa felicidade e relações sociais dependem disso. Essa é a ideologia que as culturas de massa nos impuseram.
E não são somente as aspirantes a modelo que são mortas pela sociedade de consumo. A violência mata muito mais que a anorexia. As drogas, inclusive o álcool e o cigarro, também. Tudo isso em nome de um estereotipo de felicidade que nos foi imposto, do consumir pelo consumir, do ter antes do ser. Essa crise social necessita de uma mudança de valores, de ídolos para as pessoas. As meninas devem desejar ser grandes médicas, advogadas, engenheiras, e não “artistas de TV”. As modelos não podem ser mais as de moda. Precisamos de novos ídolos, novos ícones, com outros valores, que possam servir, agora sim, de modelos de verdade.
Esse último caso foi pouco abordado na TV. A menina, negra e pobre, morreu por falta de diagnóstico da doença – media 1,70 metro de altura, pesada 38 quilos e três hospitais públicos disseram se tratar apenas de uma anemia. Isso pode ser, sim, uma das razões do silêncio da mídia, mas, pelo menos dessa vez, provavelmente não é a principal. Sendo este o sexto caso em tão pouco tempo, é natural que haja uma certa acomodação nossa em relação ao tema. Ainda bem, pois eu tampouco agüentaria muito debate acerca disso.
Nos poucos que houve, no entanto, o formato era mais ou menos o seguinte: um médico explicando a “modernidade” da doença e as formas de diagnóstico precoce, e um representante do “mundo da moda” argumentando a inocência de seu negócio e as exceções de que se tratavam aquelas meninas. A questão clínica do problema chamou minha atenção pela sua bizarrice; a da responsabilidade, pela reflexão. Devo concordar com os tais representantes do “mundo da moda”: eles não têm nada a ver com isso.
O “mundo da moda” nada mais é do que a caricatura de um paradigma social. O que tem matado as meninas não é o seu desejo de se tornarem modelos, mas toda uma concepção de valores e ideologias que pairam hoje na sociedade de consumo. Atualmente, as culturas de massa – através de todos os seus meios, como TV, rádio, música, cinema etc – nos impõem um padrão de felicidade que por nós é absorvido como uma essência humana. E esse padrão de felicidade inclui um estereotipo de beleza física que passa a ser perseguido a qualquer custo como um valor social. As meninas estão morrendo, logo, não devido a um esforço inaudito em busca de sucesso profissional, mas porque querem se adaptar a esse padrão de beleza que recebem todo dia pelas culturas de massa.
Essa idéia fica mais clara quando lhes perguntamos quais são seus exemplos de mulheres a serem admiradas e imitadas. Todas as respostas se referirão a modelos de moda, cantoras pop, enfim, as chamadas “artistas” ou celebridades. As crianças consomem beleza e moda desde pequenas: a Barbie é loira, de olhos azuis, e rica; o que se vende hoje às crianças não são brinquedos, mas o “vestidinho da Xuxa”, a “sandalinha da Eliana” e a “bolsinha da Angélica”; a Carla Perez é apresentadora de programa infantil. Essas formam o padrão de personalidade a ser imitado. Ou seja, os valores sociais – aquilo que se considera bom, bonito, honroso, digno de reconhecimento – estão completamente distorcidos. A distorção, todavia, não é na atitude de morrer por um objetivo, mas em que objetivo é esse. Madame Curie, por exemplo, uma cientista polaca vencedora de dois Prêmios Nobel, também morreu devido ao exercício exaustivo de sua profissão, de câncer. Essa, no entanto, não é apontada como um modelo de mulher a ser seguido.
Nunca vi ninguém se matar de tanto ler Kant ou, trazendo para uma dimensão mais terrena, de tanto estudar para uma prova ou para um concurso. Se matar para ficar bonita, no entanto, já temos meia dúzia de casos em dois meses. Isso simboliza a diferença de importância que as pessoas dão às coisas: hoje, ser bonito é mais importante que adquirir cultura, que adquirir capacidade de reflexão, que adquirir conhecimento. Ser bonito é mais importante que viver. Em nada nos adianta viver se não somos bonitos, se a nossa beleza não está enquadrada aos moldes determinados pela sociedade de consumo, pois nossa felicidade e relações sociais dependem disso. Essa é a ideologia que as culturas de massa nos impuseram.
E não são somente as aspirantes a modelo que são mortas pela sociedade de consumo. A violência mata muito mais que a anorexia. As drogas, inclusive o álcool e o cigarro, também. Tudo isso em nome de um estereotipo de felicidade que nos foi imposto, do consumir pelo consumir, do ter antes do ser. Essa crise social necessita de uma mudança de valores, de ídolos para as pessoas. As meninas devem desejar ser grandes médicas, advogadas, engenheiras, e não “artistas de TV”. As modelos não podem ser mais as de moda. Precisamos de novos ídolos, novos ícones, com outros valores, que possam servir, agora sim, de modelos de verdade.
Um comentário:
Não é a toa que sou fã de uma professora lá da faculdade: ela é tri bonita, mas não se limitou a ser só isso. Fez mestrado, doutorado, o currículo Lattes dela é interminável... E ainda por cima, as aulas dela são ótimas! A beleza é só algo a mais que ela tem.
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